Imagine contratar um advogado e no tribunal ele começar a atuar contra você…Infelizmente é isso que acontece em alguns casos de câncer. As células de defesa migram na direção do tumor para combatê-lo; mas, muitas vezes, são aliciadas e passam a ajudar em seu crescimento e metástase. Com o objetivo de entender como esse processo acontece e colaborar para desenvolver um novo tratamento para impedir que o tumor torne as células do sistema imune inato suas parceiras, o pesquisador João Alfredo de Moraes, do Laboratório de Biologia RedOx (Labio RedOx - ICB/UFRJ), desenvolve pesquisas para estudar o efeito das vesículas extracelulares de melanoma na polarização de neutrófilos.
O melanoma é um tipo de câncer que se desenvolve a partir dos melanócitos, que são células produtoras de melanina. O tumor ocorre geralmente na pele, mas pode manifestar-se raramente na boca, intestino ou olhos. “Hoje em dia já se sabe que o melanoma é um tipo de tumor bem agressivo. Ele é capaz de liberar pedaços de membrana, vesículas extracelulares que carregam conteúdo da célula tumoral, chegando até a circulação” - explicou João Moraes que pesquisa, desde 2011, o efeito das vesículas extracelulares de melanoma nas células de defesa do organismo. O estudo que começou no Laboratório de Farmacologia Celular e Molecluar (UERJ), sob supervisão da Dra. Christina Barja-Fidalgo, atualmente é realizado no Labio RedOx (UFRJ).
Segundo o pesquisador, quando o tumor começa a se desenvolver, o sistema imune é ativado e libera células de defesa para combatê-lo. “Só que alguma coisa acontece no meio do caminho e essas células de defesa não adotam um perfil anti-tumoral. E passam a ser pró-tumoral, ou seja, passam a atuar a favor do tumor no crescimento e metástase. O que estamos constatando é que são esses pedaços de membrana (vesículas) do tumor que fazem isso.” - observou, explicando a capacidade do neutrófilo (célula de defesa do sistema imune inato) de inverter o seu perfil de atuação: ao invés de polarizar para um perfil anti-tumoral, ele polariza para um perfil pró-tumoral.
Em seu primeiro estudo, o professor João Moraes detectou que as vesículas do melanoma eram capazes de enganar o sistema imune. E diante disse começou a se perguntar se isso aconteceria em outros tipos de câncer: “Atualmente, os mesmos testes estão sendo desenvolvidos com tumor de mama e detectamos que ele também é capaz de burlar o sistema imune. Ao constatarmos isso, estamos tentando desenvolver uma estratégia para impedir que o tumor torne as células do sistema imune suas cúmplices, em modelos in vitro e in vivo”.
Estudando novos formas para fazer o sistema imune cumprir o seu papel
A estratégia consiste em tentar bloquear a polarização dos neutrófilos para um perfil pró-tumoral, para fazer com que o sistema imune combata o tumor, mantendo o seu perfil anti-tumoral. O objetivo final é descobrir um alvo molecular que iniba o efeito "aliciador" das vesículas das células tumorais nas células do sistema imune, para então descobrir novos tratamentos eficazes para o câncer. A imunoterapia está sendo uma das abordagens terapêuticas usadas.
Para João Moraes, especialista no estudo do sistema imune inato, que são as células que migram em função de qualquer estímulo, a pesquisa básica é muito importante pois permite descobrir novos caminhos para atuar logo no começo do desenvolvimento tumoral.
“Sabendo que o neutrófilo é o primeiro leucócito do sistema imune que migra em direção a qualquer sítio inflamatório, e considerando o tumor um sítio inflamatório, o neutrófilo migra até ele com a intenção de destruí-lo, só que é polarizado para o perfil pró-tumoral, tornando-se seu amigo” - descreveu o pesquisador, ressaltando a importância dos neutrófilos nesse processo, tendo em vista que já há estudos comprovando que se o neutrófilo não chega até o tumor, ele não consegue fazer metástase, por exemplo.
"Ao longo da evolução do tumor, ele conseguiu enganar o sistema imune. Trabalhamos para fazer com que o sistema imune cumpra o seu papel”- declarou João Alfredo de Moraes, que apresentou o resultado das suas pesquisas envolvendo as vesículas extracelulares de melanoma & sistema imune inato no Seminário do mês de dezembro (03/12) do Programa de Oncobiologia.
Pra aprofundar!
Confira os artigos científicos selecionados pelo pesquisador João Alfredo de Moraes (ICB/UFRJ) para você se aprofundar no tema:
Mantovani A, Cassatella MA, Costantini C, Jaillon S. Neutrophils in the activation and regulation of innate and adaptive immunity. Nat Rev Immunol 2011;11(8):519-31.
Fridlender ZG, Sun J, Kim S, Kapoor V, Cheng G, Ling L, Worthen GS, Albelda SM. Polarization of tumor-associated neutrophil phenotype by TGF-beta: "N1" versus "N2" TAN. Cancer Cell 2009;16:183-194.
Mishalian I, Bayuh R, Levy L, Zolotarov L, Micheali J, Fridlender ZG. Tumor-associated neutrophils (TAN) develop pro-tumorigenic properties during tumor progression. Cancer Immunol Immunother 2013;62(11):1745-56.
Para simplificar!
Confira abaixo o vídeo da pesquisadora João Alfredo de Moraes falando um minuto sobre Câncer & células do sistema imune.
Por Lúcia Beatriz Torres, jornalista de Ciência, responsável pelo Núcleo de Divulgação do Programa de Oncobiologia.
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